Paróquia São Judas Tadeu - Icaraí

“Senhor, por que razão hás de manifestar-te a nós e não ao mundo?” (Jo 14,22)
A essência do cristianismo é a caridade (Vatican Media)

Em 2000 anos de história, a Igreja desenvolveu uma doutrina que baseia seus fundamentos na Sagrada Escritura, na Tradição e em seu magistério vivo, crescendo cada vez mais na inteligência da fé.

O anúncio da modificação do Catecismo da Igreja Católica sobre o tema da pena de morte tem gerado um intenso debate ao redor do mundo. Cada desenvolvimento da doutrina na história da Igreja suscitou consensos ou críticas construtivas, mas também resistências e rejeições.

Hoje pode provocar barulho uma nota da Amoris laetitia ou um novo ensinamento sobre a pena de morte, mas olhando para trás, percorrendo rapidamente 2.000 anos de cristianismo, vemos que muitas coisas mudaram e hoje chegamos a supor que sempre tenha sido assim. O fato é que toda mudança pode gerar escândalo e confusão.

A pena de morte na Bíblia

Basta ler a Bíblia para compreender quanto caminho foi percorrido. Hoje ficamos horrorizados diante de certas ordens dadas por Deus a Moisés, conforme relatado pelas Sagradas Escrituras. Em Levítico (Capítulo 20), o Senhor ordena matar idólatras, adúlteros, sodomitas, incestuosos e mesmo aqueles que maltratam o pai ou a mãe deve ser condenados à morte. É certo que Moisés viveu mais de 3.000 anos atrás. Naturalmente, essas ordens estão contidas no Antigo Testamento, mas no final da leitura sempre dizemos: Palavras do Senhor.

Progressos doutrinais na primeira comunidade cristã

Pensemos no trauma vivido pelos primeiros cristãos convertidos do judaísmo: quanta coragem que tiveram ao ter de abandonar as leis fundamentais do seu povo, como a circuncisão. Quanta abertura de mente e de espírito para aceitar os pagãos na Igreja, na época algo considerado ilícito.

Pedro – narram os Atos dos Apóstolos – já havia recebido o Espírito Santo, mas ainda não o entendia. Somente diante de um centurião romano, Cornélio, e sua família, é iluminado e diz: “Em verdade, reconheço que Deus não faz distinção de pessoas, mas em toda nação lhe é agradável aquele que o temer e fizer o que é justo. Deus enviou a sua palavra aos filhos de Israel, anunciando-lhes a boa nova da paz, por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos.” 

Nesta frase, “eu reconheço” há todo o gradual progresso de nosso conhecimento da verdade de Deus. Um caminho que não termina enquanto durar a história. Cresce a inteligência da fé.

Primeiros Concílios Ecumênicos

Pense no caminho da Igreja nos primeiros Concílios Ecumênicos ao estabelecer os fundamentos das verdades cristãs, a partir da Trindade e dos dogmas cristológicos. Tantas as lutas contra as heresias neste período sob o lema “Extra ecclesiam nulla salus” (fora da Igreja não há salvação). Nenhum paraíso, portanto, para os não-batizados.

No entanto, pouco a pouco se compreendeu de maneira mais profunda este conceito, como diz a Declaração Dominus Jesus assinada pelo cardeal Ratzinger:  “Quanto ao modo como a graça salvífica de Deus, dada sempre através de Cristo no Espírito e em relação misteriosa com a Igreja, atinge os não cristãos, o Concílio Vaticano II limitouse a afirmar que Deus a dá « por caminhos só por Ele conhecidos” (n.21). Entendemos sempre melhor que Deus quer salvar a todos.

Heresias e violência

A luta contra os heréticos, contra aqueles que pensam de maneira diferente, sabemos disto, trouxe terríveis consequências na história: guerras religiosas, fogueira, inquisição. Ainda que muitas lendas obscuras promovidas pela propaganda anticatólica tenham sido desmascaradas por historiadores, não nos escondamos atrás de um dedo: a Igreja, filha de seu tempo, muitas vezes compartilhou a sua mentalidade.

Hoje trememos ao ler a Bula pontifícia “Ad Extirpanda”, promulgada em 1252 pelo Papa Inocêncio IV e confirmada pelo Papa Alexandre IV em 1259 e pelo Papa Clemente IV em 1265:  o documento aprovava a tortura dos suspeitos de heresia, embora muito reduzida quando comparada com o que foi feito por contemporâneos: não devia buscar mutilações, nem derramamento de sangue, nem a morte. Tudo isso porque a salvação da alma era considerada acima de todas as coisas. Quantas mudanças desde então.

Compreensão gradual da liberdade de consciência

E quanto caminho foi percorrido em relação à doutrina da Encíclica Mirari vos do Papa Gregório XVI, de 1832. É óbvio, estamos em um contexto histórico muito difícil para o papado, passaram-se quase 200 anos, mas algumas frases nos fizeram compreender melhor as razões dos progressos doutrinais.

Gregorio XVI define a liberdade de consciência como um “delírio” um “erro venenoso”, que abre o caminho para “aquela total e irrestrita liberdade de opinião, que aumenta cada vez mais em detrimento da Igreja e do Estado”, em acréscimo “àquela péssima, nunca suficientemente execrável, detestável e abominável “liberdade da imprensa” em divulgar escritos de qualquer tipo”. A Igreja aprendeu melhor a entender o que é a liberdade também daqueles que não estão na Igreja.

Escandalizado por uma doutrina em mudança

O escândalo do desenvolvimento da doutrina esconde um problema central da fé: uma Lei que não muda dá segurança e poder ao homem que, desta forma, consegue controlar os seus comportamentos religiosos e também a manipular as exigências das normas divinas. Uma Lei que muda, tira esse poder e o coloca nas mãos de um Outro. Esta foi a grande batalha de Jesus com os fariseus. Jesus se colocou como Lei viva, enquanto os fariseus pediam uma Lei escrita e silenciosa que eles pudessem administrar.

Se a Lei é viva, ela não deixa de falar e de dizer coisas novas e, acima de tudo, nos força a mudar. Isto não nos agrada, porque em cada um de nós existe sempre um fariseu que aparece com as suas razões imutáveis e imóveis. A lei do amor, no entanto, nos move, nos impele a um contínuo êxodo do eu para o tu. É um contínuo progredir no conhecimento da verdade absoluta que é Deus e Deus é amor. E o amor nos obriga a mudar para o outro. A beleza é que também Deus – que é o mesmo ontem, hoje e sempre – mudou por amor a nós: e se fez homem.

Pertencer à verdade

Voltando Pedro perante os pagãos, estava aprendendo que não era ele o mestre da verdade, mas que ele pertencia à Verdade. Enquanto falava, o Espírito Santo desceu sobre todos os que ouviam seu discurso: “Os fiéis da circuncisão, que tinham vindo com Pedro, profundamente se admiraram, vendo que o dom do Espírito Santo era derramado também sobre os pagãos; pois eles os ouviam falar em outras línguas e glorificar a Deus. Então Pedro tomou a palavra: Porventura pode-se negar a água do batismo a estes que receberam o Espírito Santo como nós? “. É Deus que nos faz compreender sempre melhor a Si mesmo. Nos faz compreender que a essência do cristianismo é o amor.

Nenhum Pedro será contra a Igreja

Por fim, para aqueles que contrapõe Bento XVI e João Paulo II a Francisco, podemos recordar as reconfortantes palavras pronunciadas pelo Papa Ratzinger em 27 de maio de 2006 em Cracóvia, diante de um milhão de jovens.

Aos jovens crescidos na fé fé pelo Papa Wojtyla, Papa Bento XVI diz com força: “Não tenha medo de construir sua vida na Igreja e com a Igreja! Tenha orgulho do amor por Pedro e pela Igreja que lhe foi confiada. Não se deixe enganar por aqueles que querem se opor a Cristo para a Igreja! (…) Vocês jovens conheceram bem o Pedro dos nossos tempos. Não tenhais medo de construir a vossa vida na Igreja e com a Igreja! Sede orgulhosos do amor a Pedro e à Igreja que lhe foi confiada (…). Vós, jovens, conhecestes bem o Pedro dos nossos tempos. Por isso, não vos esqueçais que nem aquele Pedro que da janela de Deus Pai está a observar o nosso encontro, nem este Pedro que agora se encontra diante de vós, nem qualquer Pedro sucessivo jamais será contra vós, nem contra a construção de uma casa duradoura sobre o rochedo. Ao contrário, ele há-de empenhar o seu coração e ambas as suas mãos para vos ajudar a edificar a vossa vida sobre Cristo e com Cristo”.

Por Sergio Centofanti
Via Vatican News

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